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sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

MÚSICA - Khrystal: o brilho da força e a rebeldia do povo nordestino

Estrela potiguar disputou hoje a semifinal no programa The Voice Brasil. Foto:DivulgaçãoQuem vê Khrystal brilhando no programa global The Voice Brasil e enchendo de orgulho os potiguares, pode não imaginar a trajetória de luta e superação enfrentada pela cantora. Khrystal Gleyde Saraiva Santos ou simplesmente Khrystal parece ter sido predestinada a brilhar. Mas antes disso, viveu uma verdadeira odisséia em busca do seu lugar ao Sol no mundo musical.

O gosto pela música surgiu desde cedo, ainda na infância, fruto da influência de seus pais e irmãos. O pai de Khrystal, Cícero Saraiva dos Santos, tocava violão e era integrante do Trio Puracy, que à época, representava para o Rio Grande do Norte o que o Trio Irakitan representava para o Brasil. 

O fim do grupo causou em Cícero um sentimento de revolta e tristeza, o que lhe fez proibir, a qualquer um dos seus filhos, seguir a carreira artística. A já decidida garota de 14 anos resistiu à imposição e seguiu o seu próprio rumo. Casou, teve uma filha e foi em busca do seu sonho. Neste ínterim, decidiu voltar para casa. Apesar de estar mais madura, o sentimento era de que ainda estava muito longe de alcançar seus objetivos.

Para não se afastar do meio musical, a jovem cantora passou a ser dançarina de uma banda de samba e pagode e ainda enveredou como locutora de uma rádio comunitária da zona Norte. E como boa parte dos cantores potiguares que não conseguem apoio para direcionar suas carreiras, ela foi em busca do reduto dos “marginalizados” no segmento. E foi no Beco da Lama que Khrystal conheceu Carlança, músico da noite, que começou a depurar o talento da jovem. Depois, também conheceu Pedrinho Abech, proprietário de um bar na rua Gonçalves Ledo, no centro da cidade – que nos dias de hoje pode até ser comparado ao “The Voice do Beco da Lama”. Era lá que ela pedia para cantar e tocar violão, mesmo sem possuir o instrumento. Por um período de quatro horas, Khrystal aguentava o vai e vem de bêbados e ganhava um cachê de R$ 7, além de comida. Como morava na zona Norte, para não voltar de madrugada, também negociou dormir no palco do bar.

Já com uma bagagem maior, Khrystal começou a ser respeitada pelos músicos, o que gerou convites para tocar em outros locais, como o Shock Bar, em Pirangi, de propriedade de Múcio Varela. A oportunidade lhe abriu as portas para um público mais alternativo e mais elitizado, diferente do anterior. O jovem talento começou a tocar com músicos respeitados do cenário local, como Junior Primata, Rildo, Marcelo Tinoco, entre outros nomes, e desta forma ganhou “ares de cantora”.

Foi neste período que surgiu na vida de Khrystal, Raquel Groismann, que através do seu conhecimento no meio passou a levar a cantora para conviver com músicos. E foi a ligação de Raquel com o renomado produtor cultural José Dias, o princípio de uma parceria de sucesso, que dura até hoje.

José Dias, que mais tarde se tornaria não só o produtor como o marido de Khrystal, conta que ainda não tinha ouvido falar da cantora. “Estava triste com o término do Projeto Seis e Meia [o qual era produtor]. Raquel me ligou e disse que ia me apresentar um grande talento. Lembro que Khrystal chegou de sandália japonesa, short, blusa esgarçada e segurando o violão. Ela cantou uma música de Nando Reis, que não era nem o meu perfil. Olhei para Sílvio Caldas, um grande amigo e que sempre teve muita sensibilidade, e ele piscou o olho. Aí eu disse: ‘Quer trabalhar comigo?’. Ela de pronto respondeu: ‘E você acha que eu vim aqui para quê?’ Foi então que vi a força daquela mulher e a rebeldia do povo”, contou José Dias.


VISIBILIDADE 
O produtor cultural mais badalado do segmento, agora tinha a responsabilidade de cuidar da carreira de uma ilustre desconhecida. O primeiro contrato desta nova parceria foi uma apresentação numa pousada na praia de Touros para um grupo de 200 portugueses. O cachê de Khrystal que girava em torno de R$ 7 foi para R$ 300. Na plateia, a presença de uma dos maiores cantores pop de Portugal, Rui Veloso, que já tinha cantado até para Paul McCartney. “Ao final do show, Rui me procurou e fez questão de dizer que Khrystal era maravilhosa e eu estava com um diamante na mão. Voltei para Natal em êxtase, mas me questionei: que tipo de produtor era eu que ainda não tinha conhecido um talento como ela?”, desabafou José Dias.

Outro momento marcante para o produtor foi o encontro na Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte (Fiern) da cantora com o renomado músico Guinga, que semeou sua ida ao Programa Sr. Brasil, apresentado por Rolando Boldrin, na TV Cultura de São Paulo.

Ele também conta um fato importante da trajetória da cantora, quando ela não tinha como pagar a Ordem dos Músicos. “Mesmo vivendo na marginalidade, ela tinha esta consciência. Pagamos o que era devido, na ocasião um débito de R$ 160, e quando ela pegou sua carteira, agradeceu e falou: ‘Obrigada Zé, agora sou uma mulher livre’”.

Ao lado da banda Perfume de Gardênia, Khrystal teve uma participação no Carnatal. Apesar da excelente receptividade do show pelo público da festa, segundo José Dias, ela teve uma atitude digna de quem sabe o que quer. Ao terminar a bela apresentação, Khrystal, com o dedo em riste, afirmou ao produtor ter certeza que não era aquilo que queria para sua vida.


COISA DE PRETO
Khrystal passou a tocar em barzinhos, shoppings, projetos musicais, mais ainda seguia a linha de músicas mais comerciais, não tendo uma identidade definida. Dessa forma, foi feita uma renovação no repertório e inserido o coco e pinceladas de embolada ao funk.

Foi assim que surgiu o CD de estreia, Coisa de Preto. Mais cuidadosa com a produção, desde cuidados com a mesa do som ao microfone do estúdio, a voz poderosa da potiguar viajou pelo país, mais precisamente em 17 capitais e em Portugal, país onde fez quatro shows.

Numa época de pirataria, a cantora emplacou a venda de mais de 10 mil CDs e abrilhantou programas nacionais como Som Brasil e Destino Brasil – Música, no Canal Brasil. Tudo isso a credenciou para o seu segundo trabalho, o CD autoral “Dois Tempos”, marcado pela originalidade. “Inserimos no trabalho o violão de Djavan e terminando o disco, Khrystal deu a cara para bater. Recebemos o convite de um amigo para ela se inscrever no The Voice e acredito que a principal função do programa é torná-la conhecida em todo o Brasil”.


PEIXEIRA NA MÃO
Após a apresentação no The Voice da música Carne – de autoria do Seu Jorge – que arrancou aplausos da plateia e a fez ser escolhida por Claudia Leite para continuar na competição, Khrystal voltou a Natal para rever a família. De acordo com José Dias, quando ela chegou ao aeroporto Santos Dumont foi parada por um senhor que varria o chão e ele perguntou: “Isso é Khrystal?”. Ela acenou com a cabeça e o senhor continuou: “Poxa neguinha, você botou para f… hoje”. José Dias completou: “Esse reconhecimento não tem preço e demonstra a enorme abrangência do programa. Muitos dizem que sou responsável pelo sucesso de Khrystal, mas apenas abri caminhos e sou apenas um elemento neste processo, que conta com o apoio de personagens importantíssimos como Pedro Abech e Múcio Varela”.


 portaljh

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